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Obra de Zahidé Machado Neto, pioneira dos estudos feministas, é tema de pesquisa na FFCH

Trajetória está sendo revisitada 32 anos após sua morte

A trajetória acadêmica da socióloga baiana Zahidé Machado Neto (1931 - 1983) - uma das pioneiras dos estudos feministas e de gênero no Brasil, que, contudo, jamais teve sua produção intelectual reunida e revisitada - é tema de uma pesquisa que vem sendo realizada desde agosto deste ano pelo Gira (Grupo de Estudos Feministas em Política e Educação) da Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas, no campus de São Lázaro.

Líder de pesquisas coletivas de campo no interior baiano nos anos 60 e 70 - algo raro na época - e autora de textos precursores da antropologia feminista e dos estudos de gênero - campos de investigação que só viriam a se consolidar nos anos 80 - , Zahidé Machado Neto morreu precocemente, em um acidente de carro, aos 51 anos, em março de 1983, meses antes da fundação do NEIM (Núcleo de Estudos Interdisciplinares sobre a Mulher) da FFCH - de cujo projeto foi uma das idealizadoras. 

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Ao longo da carreira, Zahidé publicou dezenas de artigos, mas, atualmente, a maior parte desses textos encontra-se dispersa - o que, consequentemente, faz com que ela seja pouco lida pelas novas gerações. "É só uma questão de qualidade e atualidade? Não. Lendo seus textos, se vê que é um pensamento super atual. Achamos que tem aí uma questão de gênero, de androcentrismo [visão de mundo que supervaloriza o ponto de vista masculino] da ciência. É preciso, então, quebrar essa narrativa 'dos homens'", explica o coordenador do GIRA, Felipe Bruno Fernandes, professor do bacharelado em Gênero e Diversidade da FFCH.

Indício desse androcentrismo, segundo Fernandes, é o fato de a única publicação em livro de Zahidé ("Sociologia Básica", ed. Saraiva, 1975) ter sido em coautoria com seu marido, o jurista e professor da Faculdade de Direito da UFBA Antônio Luís Machado Neto - que publicou vários outros livros e, até hoje, "tem muito mais visibilidade que Zahidé", observa. Fernandes explica que o interesse específico do GIRA pela trajetória da cientista social baiana é apenas o ponto de partida de um projeto de pesquisa mais amplo, também coordenado por ele, que pretende mapear a história e as características do ensino de Antropologia na Bahia. 

A equipe multidisciplinar de bolsistas do GIRA - formada pelas graduandas Bárbara Souza, do bacharelado em Gênero e Diversidade; Míria Moraes, de Psicologia; Maiara Amaral e Anne Alencar, de Ciências Sociais - já realizou um mapeamento preliminar dos documentos sobre Zahidé encontrados, em bom estado de conservação, no acervo da FFCH, que atualmente encontra-se organizado graças ao trabalho da servidora Marie Dupuit, responsável pelo acervo. Além de dados biográficos gerais, as estudantes reuniram detalhes importantes da trajetória acadêmica da socióloga: graduada em Direito (1955) e Ciências Sociais (1959) pela UFBA, com doutorado inconcluso em Sociologia pela USP (por conta de sua morte pematura), Zahidé foi coordenadora do CEAO (Centro de Estudos Afro-Orientais) em 1961; coordenadora do colegiado curso de Ciências Sociais da FFCH (1969-73) e assessora e técnica da comissão de implantação da reforma universitária na UFBA (1969-70), tendo ainda lecionado por um curto período na Universidade de Brasília (UnB).

É no campo do feminismo, entretanto, que parecem estar os trabalhos mais originais de Zahidé. Seu primeiro artigo sobre o tema, de 1968, trata da relação entre a mulher e o mercado de trabalho na profissão de professora primária. Em 1975, ministrou na UFBA um curso pioneiro de "Sociologia da Família e Relações Entre os Sexos". Além de ter sido membro do grupo de trabalho "Mulher e força de trabalho" da ANPOCS (Associação Nacional de Pesquisa e Pós–graduação em Ciências Sociais) e coordenadora do projeto "A família na Bahia no século XIX: status da mulher", ela foi professora convidada do "Seminário sobre Mulher, Trabalho e Ideologia" da Universidade de Paris, em 1981. Dali resultou o artigo intitulado “Mulher, trabalho e discriminação, estudo piloto em Salvador", publicado em co-autoria com a então orientanda Luzinete Simões Minella - hoje professora da Universidade Federal de Santa Catarina. Outro estudo relevante de Zahidé é "Meninos Trabalhadores", sobre o trabalho infantil em Salvador, publicado nos Cadernos de Pesquisa da Fundação Carlos Chagas, em 1982. Em homenagem a Zahidé, o Centro de Documentação, Informação e Memória do NEIM recebeu seu nome.

A partir desse levantamento inicial, as integrantes do GIRA partirão para a realização de entrevistas com pessoas que tiveram algum contato com Zahidé e/ou sua obra - nesse sentido, quem tiver alguma informação pode entrar em contato através do e-mail fernandes.felipebruno@gmail.com .