Em dezembro passado, a Financiadora de Estudos e Projetos (Finep) repassou com certo atraso ao Instituto de Energia e Ambiente da Universidade de São Paulo (IEE-USP) R$12,3 milhões destinados à Rede de Pesquisa e Desenvolvimento em Gás não convencional no Brasil (Rede Gasbras), que deve iniciar seus trabalhos em breve. Liderado pela instituição paulista, essa rede nacional vai estudar formas de aproveitamento econômico e sustentável do gás brasileiro e contará com fortes contribuições de dois institutos nacionais de ciência e tecnologia da UFBA: o de Geofísica do Petróleo, INCT-GP, e o INCT- Energia e Ambiente.
Registre-se logo que a participação na Rede Gasbras – aqui lembrada de cara porque o repasse dos recursos é notícia ainda relativamente fresca – é apenas um exemplo entre numerosos outros das atividades do INCT-GP em projetos de pesquisa no campo da geofísica do petróleo.
Esse instituto, coordenado pelo professor Milton José Porsani, iniciou suas atividades em abril de 2010, pouco depois de o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) definir os 122 INCTs pioneiros do país. Recentemente, em novembro passado, foi confirmado entre os 100 novos INCTs que submeteram propostas em 2014 e serão efetivamente a apoiados (financiados) pelos próximos cinco anos.
O INCT-GP está intimamente vinculado à análise da situação do setor de petróleo e gás no país e no âmbito internacional. Desde sua concepção esteve voltado a identificar “os principais gargalos científicos e tecnológicos em que a geofísica pode dar contribuições relevantes às soluções de problemas associados à exploração do pré-sal, aos campos maduros e aos folhelhos gasógenos”.
O texto conta da proposta submetida ao CNPq em 2014, mas era essa a clara vocação do INCT-GP desde o projeto original. Da mesma forma, o objetivo declarado na proposta de 2014, valeria desde os primeiros passos do INCT – GP. O que se pretende, ele esclarece, é “contribuir para a expansão das reservas de hidrocarbonetos no Brasil, incluindo reservas não convencionais, redução do risco exploratório e aumento do fator de recuperação das reservas, através do desenvolvimento científico e tecnológico de métodos geofísicos de forma integrada com a formação de recursos humanos, e a transferência de conhecimentos e tecnologias para a indústria e a sociedade”.
O INCT-GP chegou ao momento de pedir novo financiamento ao CNPq contando com cerca de 30 pesquisadores de cinco instituições. Contabilizava a publicação de 5 livros e 97 artigos científicos resultantes de suas pesquisas, dos quais 81 em periódicos internacionais.
“Eu diria que os R$5 milhões de financiamento para os primeiros anos do INCT-GP serviram sobretudo para montar uma boa infraestrutura laboratorial de processamento de imagens, com magnetômetro e outros equipamentos de alto custo e fundamentais para pesquisas da natureza que fazemos”, explica o professor Porsani. Mas, acrescenta ele, foram tempos também de “transferir nossa experiência em sala de aula, de aprimorar o processo de interação entre os pesquisadores dos diferentes grupos, intensificar as orientações compartilhadas, artigos em coautoria, treinamentos conjuntos, etc.”.
Na contabilidade dos primeiros anos deve-se incluir também, pelo lado tecnológico do INCT-GP, o desenvolvimento de novos métodos para imageamento geofísico e para análise e filtragem de dados geofísicos. E em sua contribuição para a formação de recursos humanos, há que se destacar a criação de seis disciplinas nos programas de pós-graduação com os quais está envolvido, a organização de 11 eventos científicos, dos quais três internacionais, e a elaboração de 61 dissertações de mestrado e 17 teses de doutorado.
Assim, avaliado globalmente como “ótimo” pelo CNPq, não foi exatamente uma surpresa que o INCT-GP tenha sido aprovado no edital de 2014, com um financiamento previsto inicialmente de R$10 milhões para os próximos cinco anos, metade bancado pelo governo federal e metade pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado da Bahia (Fapesb). Entretanto, foi aplicado logo um corte de 30% no recurso previsto.
Atualmente, além da infraestrutura de excelente qualidade, é importante destacar que o INCT-GP tem 43 pesquisadores vinculados a seis instituições: UFBA, Universidades Federais do Pará e do Rio Grande do Norte (UFPA e UFRN), Universidades Estaduais de Campinas e do Norte Fluminense (Unicamp e UENF) e mais o Senai-Cimatec que foi agregado ao grupo já para o segundo edital.
As cinco primeiras instituições, segundo a proposta apresentada em 2014 ao CNPq, “representam a quase totalidade da experiência da universidade brasileira na área de pesquisa e formação de pessoal em geofísica aplicada à exploração e estudos de reservatórios de petróleo”. Já o sexto grupo, segundo o mesmo texto, “formado por pesquisadores de computação de alto desempenho”, acrescenta ao INCT-GP “maior capacidade e conhecimento na área de computação de alto desempenho”.
Que o INCT-GP tem nítida vocação multidisciplinar está claro desde sua constituição. Pesquisadores das áreas de geofísica, geologia, engenharia de reservatórios e matemática aplicada, além da computação, são todos altamente necessários para um instituto que inclui entre suas principais metas de pesquisa a melhoria do imageamento sísmico e da caracterização de reservatórios petrolíferos na área do pré-sal, a redução do risco da exploração de petróleo e gás em áreas de geologia complexa, através da integração de métodos geofísicos, a melhoria do monitoramento geofísico de reservatórios em campos maduros (aqueles em que a produção é declinante), estudos geofísicos para avaliação do potencial exploratório de reservas de folhelhos gasógenos e melhoria do processamento de dados sísmicos de bacias sedimentares terrestres brasileiras.
Imagens de pequenos abalos sísmicos
Entre as frentes de pesquisa do instituto, uma das mais significativas e de maior interesse da indústria do petróleo é a de melhoramento dos métodos de imageamento sísmico. Porque são eles, explica Porsani, que respondem por 90% do conhecimento mais preciso que se pode ter previamente das áreas de exploração. Métodos eletromagnéticos, por exemplo, são complementares para que se obtenham dados sobre o desenvolvimento dos reservatórios.
“Quando vai furar, a que profundidade, quando se precisa olhar as camadas, a estrutura da área, tudo isso é informado pelos métodos de imageamento sísmico”, diz o pesquisador. E ele não se furta a detalhar em linha geral como se obtém essas imagens. “Para obter esse imageamento, são colocadas várias fontes explosivas na terra ou no mar e vários sensores que vão recolher as respostas nas estruturas visadas a essas explosões, como se produzíssemos pequenos abalos sísmicos e captássemos seus resultados”. As imagens obtidas a partir dos sinais sonoros depois precisam ser trabalhadas minuciosamente, refinadas com processos computacionais e algoritmos de filtragem para obtenção dos traços sismográficos.
A experiência de Porsani com grandes grupos em pesquisa de geofísica de petróleo, na verdade, antecede a criação e coordenação do INCT-GP. Em 2000 ele submeteu ao programa Redes Norte-Nordeste da Finep uma proposta de rede de pesquisa em geofísica de exploração, juntamente com um grupo da UFRN e outro da UFPA. Obtiveram financiamento de R$1 milhão, principalmente em bolsas e o projeto prossegue até abril próximo. Naturalmente essa expertise foi considerada quando ele apresentou a primeira proposta de um INCT ao CNPq.
Milton José Porsani fez a graduação em Geologia na USP, o mestrado em métodos eletromagnéticos para exploração de água subterrânea na UFPA e veio em 1982 para o doutorado na UFBA, no primeiro programa de formação de mestres e doutores de geofísica da Universidade, criado pelo professor Carlos Dias. Estava num pós-doc em Vancouver, quando aconteceu, em 1990, a oportunidade de fazer concurso para professor da UFBA. Voltou, fez o concurso, passou e só retomou o pós-doutoramento em 1993, na Universidade do Texas.
Porsani diz que sua grande expectativa com o INCT-GP hoje é torná-lo efetivo, uma unidade permanente na UFBA e com capacidade de sustentação para além dos editais do CNPq e para tanto, além do conhecimento gerado, dos métodos de melhoria do imageamento sísmico e outros, certamente será importante, na interação com a indústria, chegar também à construção de produtos e protótipos.
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