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Mesa debate desafios do anticapitalismo

A construção de uma alternativa ao neoliberalismo

 

É possível viver sob uma lógica não capitalista? Os integrantes da Mesa Anticapitalismo na Era Neoliberal, realizada ontem no Salão Nobre da Reitoria, dentro da programação da Universidade Federal da Bahia no Fórum Social Mundial, defendem que sim.  Mas esse é um processo ainda em andamento, especificamente na América Latina.

Os desafios para a construção de uma alternativa ao sistema vigente foram discutidos pela pesquisadora Maria Victoria Espiñeira Gonzalez, professora da Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas da UFBA, o sociólogo e cientista social Emir Sader, coordenador do Laboratório de Políticas Públicas da Universidade Estadual do Rio de Janeiro – UERJ, a cientista social argentina Luciana Ghiotto e os economistas René Ramírez Gallegos, equatoriano, e Rómulo Torres Seoane, peruano. 

Para o cientista social Emir Sader três premissas básicas guiam a esquerda latinonamericana no seu enfrentamento ao neoliberalismo: a prioridade dada às políticas públicas, o processo de integração com outros países latinos e o resgate do papel ativo do Estado. Este tripé confronta a centralidade do mercado e influencia o desenvolvimento de uma dinâmica de reconhecimento dos direitos do cidadão. “O anticapitalismo ataca a lógica mercantil que transforma tudo em mercadoria e promove a esfera pública, os interesses do cidadão”, observou.

Já a pesquisadora Victoria Gonzalez chamou atenção para a crise de representação hoje enfrentada, quando a nova direita questiona a democracia. Ela fez referência ao filósofo francês Jacques Rancière, autor de "O Ódio à Democracia", que argumenta que a democracia é “o poder daqueles que não têm títulos ao poder. “Hoje a democracia seria ausência de títulos e por isso causa ódio no Brasil”, considerou a pesquisadora. 

Em seguida, o economista Rómulo Seoane, diretor do Forum Solidaridad Perú, lembrou de alguns problemas atuais relacionados ao desenvolvimento capitalista, como os grandes projetos extrativistas e a evasão fiscal. “O capital procura crescer de maneira permanente e sem travas”, alertou. A busca de novos territórios e a criação de mecanismos para evadir os impostos são alguns dos elementos perniciosos envolvidos nesse processo. Seoane destacou que os movimentos de defesa do território e a luta contra evasão fiscal são base da luta anticapitalista. “É necessários que os diferentes movimentos estejam articulados e o Fórum Social Mundial é um grande espaço para promover essa articulação”.  

Articulação também foi a palavra de ordem da cientista social Luciana Ghiotto, pesquisadora da sede argentina da Facultad Latinoamericana de Ciencias Sociales - FLACSO, para quem “lutar contra o livre comércio é falar de anticapitalismo”.  A campanha continental que uniu movimentos de diversos países contra a Área de Livre Comércio das Américas – ALCA, nos anos 1990, foi lembrada como exemplo a ser retomado. A rearticulação, na visão da cientista, deve ser pensada a partir de quatro pontos. Primeiro, uma releitura de diagnóstico da realidade mundial e local, já que hoje “o mundo está em forte processo de transição e o capitalismo muda rapidamente”.  Depois, se reinventar alternativas e rediscutir caminhos a seguir. Para concretizar a rearticulação, Ghiotto defende que se transcenda as agendas fechadas dos movimentos e se busque uma agenda social continental.

O economista René Ramírez Gallegos, ex-Secretário de Educação Superior, Ciência, Tecnologia e Inovação do Equador, exemplificou as mudanças ocorridas naquele país durante a década de governo do ex-presidente Rafael Correa como instrumentos para a construção de uma economia social e solidária, em contraponto ao capitalismo. Ele destacou o novo pacto social de convivência proposto pela nova constituição equatoriana e sua visão biocentrista. “Nossa constituição fala de direitos da Natureza. Impor limites biofísicos através do cuidado com a Natureza é impor limites ao capitalismo”, assegurou.

Ele ressaltou que apesar das mudanças obtidas no seu país, a percepção sobre elas ainda pode ser negativa. “Observamos o que chamamos de Paradoxo do Bem Estar Objetivo e do Mal Estar Subjetivo. Melhoramos as condições de vida, mas a nova classe média começa a ter expectativas de classe rica, fruto de um capitalismo cognitivo que precisa mudar. Necessitamos também de uma pedagogia política de conscientização social”, considerou.